Este post é sem propósito. Não tem nada a informar e não acrescenta nada. Meu blog é nada coisa nenhuma. Não tem nada de mestre. Nenhuma fagulha de Peter Greenway, a beleza de Hope Sandoval nem a elegância dos Tindersticks.
Peter Greenway, fotografado por Sebastião Salgado
sábado, maio 22, 2004
sábado, maio 01, 2004
(Nettwerk America, 2004)
Se por uma fração de segundo desvias os olhos e procuras absorver todos os pormenores estéticos, utilizando todos os sentidos para, talvez, tornar-se parte, é possível que estejas próximo, sem obediência nenhuma, da paixão.
E se esta paixão resumir-se a uma trilha sonora? E se as palavras que perseguem a melodia transparecessem versos a falar de lembranças e sentimentos, encadeadas por símbolos, quebra da sintaxe e da pontuação? Uma solução intimista? São com estas cores que se misturam em uma imagem desfocada, com bela harmonia que Retriever se define.
O sétimo álbum de Ron Sexsmith é um convite difícil de se recusar a um universo pictórico com atmosfera, nuvens e arrebóis. O cantor não surpreende ao fazer de Retriever um dos lançamentos mais agradáveis de 2004. É um dos poucos cantores que ainda sabe unir bom texto e melodia com senso de responsabilidade. Se em “Hard Bargain” ele equipara as dificuldades de uma relação amorosa a um difícil acordo financeiro, em “Not About To Lose”, descarta a perda de sentimento e, “Tomorrow in Her Eyes”, executada ao piano (como Paul McCartney), saca alegrias futuras : “I see tomorrow in her eyes / And where my future lies / So I don't need a crystal ball / At all because I've seen tomorrow / In her eyes”.
Os temas de Retriever não são impassíveis. Quando Sexsmith refere-se a dor (“I Know It Well”), esperança (“How on Earth”), sofrimento (“Dandelion Wine”) e solidão (“Imaginary Friends”) ele sabe bem do que está falando. Ele vive todos estes instantes e deles extrai a matéria-prima para suas canções. A busca de felicidade está sublimada em todas as palavras de “Hapiness”: “Happiness so hard to come by / So good while it lasts / Some people say /That it ain't worth pursuing / Cos' it's always moving too fast”. A compaixão tem moradia em “For The Driver”, canção reflexiva sobre as dores dos soldados, condutores e crianças “I feel for the soldier / In the throes of war / Sent off to settle someone else's score / For the ones involved / And the most unloved I feel / I feel for the soldier”.
Outras canções caputram o ouvinte pelas pegadas magnéticas. É o caso do soul setentista “Whatever It Takes” e de “Wishing Wells”.
Certamente Retriever será ignorado pelas listas de melhores de 2004. Há tempos Ron Sexsmith lapida seus cristais e não é plenamente reconhecido, embora tenha o aval de Elvis Costello, Joni Mitchell e Chris Martin. Melhor assim, pois é um trabalho que poderá ficar muito tempo no CD player apenas pela música. Isso já é o bastante.